terça-feira, 2 de janeiro de 2018

A SUICIDA

                                   Três e meia da manhã... 
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Claudia largada no sofá de veludo vermelho tem um olho na TV e outro no relógio..
 A TV transmite mais um documentário sobre o 11 de Setembro. 


 Desta vez estão explorando a miséria dos catadores de papel que viviam do lixo das Torres Gêmeas.


Bin Laden detonou o símbolo do capitalismo e por uma ironia terrorista até os excluídos foram incluídos no seu plano...Mas Claudia não se importa com o mundo:    
 "Danem-se Bin Laden e o World Trade Center... Ninguém me come mesmo!" 

Pensa alto, com a indiferença típica das mau amadas, das não comidas...


E o tempo passa...Três e trinta e um...


O relógio digital torna ainda mais angustiante a sua condição de mulher solitária.


A ausência do tic-tac lhe dá a sinistra impressão de ter sido abandonada até mesmo pelo tempo.


Sente-se como se estivesse presa numa cela com paredes de espelhos. O passado e o futuro são reflexos de um eterno presente. Sim, Claudia está condenada a um presente que se alterna entre o insosso e o insólito.


Ela vive mais uma noite de vigília. Outra noite inútil soma-se aos vazios de sua existência.


Mas afinal o que Claudia tanto espera? Um príncipe encantado que lhe declame versos adocicados? Aguarda quem sabe a chegada repentina de um galã cafajeste do cinema mexicano? Não. Nem um nem outro.


Claudia, presa a sua solidão não consegue perceber que está a procura de si mesma, e fantasia sua ânsia com figuras recortadas dos seriados da TV.


Na sua quase sublime mediocridade ela olha pra própria vida e se identifica com as personagens de"Sex and the city" ... E num gesto que nos deixa pasmem, ela suspira e se sente feliz por ser infeliz...


Deitada no sofá de veludo vermelho Claudia rejubila-se com sua angustia. E se a olharmos sem as lentes do romantismo perceberemos que ela sustenta um leve sorriso de satisfação.


Ela desliga a TV e vai até a estante a procura de um livro de poesia...


É preciso glamorizar seu sofrimento e a poesia é o melhor acessório para a dor...


Busca por Cecília Meireles...


Abre o livro a procura do seu favorito: Retrato...


Lê o poema com a sofreguidão de uma viciada diante de uma carreira de cocaína...


Seus lábios tremam tanto que mal consegue pronunciar a ultima frase:


"Em que espelho ficou perdida a minha face?"


E naquele instante ela percebeu que não existiam motivos para cantar.


Tendo como companheiro apenas o silêncio manco da madrugada paulistana, Claudia vai até o espelho do banheiro e vê que seu rosto de cera não consegue mais sustentar as máscaras...


De nada adiantam os cremes, o botox , os ácidos e o colágeno se os seus olhos só brilhavam a base de cocaína...


Seu corpinho de menina que fazia tanto sucesso entre os pedófilos mal resolvidos agora lembra o que há de mais grotesco nos anões pintados por Velasques.


Assustada com a verdade refletida no espelho do banheiro Claudia corre até a mesa da sala e como uma médium psicografa mensagens a si mesma, mas as endereça a quem quiser ler, e se joga do vigésimo andar...


Durante o percurso seu espirito despede-se do corpo e o corpo produz o último esguicho de adrenalina.


De repente o baque seco. O crânio explode na quina da guia, os braços abraçam o asfalto e as pernas desenham um quatro. Uma pose de dar inveja as figuras do cubismo, mas sem vida...Sem posteridade...Apenas matéria amontoada.


Claudia está morta. Não suportou descobrir que o tempo roubara sua juventude.


MAS E VOCÊ? JÁ SE OLHOU NO ESPELHO HOJE ?

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